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Marta Peral Ribeiro

Marta Peral Ribeiro
– Consultora de Comunicação –

Apesar de ouvirmos falar de algoritmos, a verdade é que não é um tópico muito explícito nas plataformas sociais – ainda que determine tudo o que vemos.
Por que ouvimos tanto, mas sabemos tão pouco sobre como funcionam? Como é que moldam as nossas experiências e qual o seu impacto na vida dos influenciadores digitais e de quem tem negócios online?
Marta Peral Ribeiro

Marta Peral Ribeiro
– Consultora de Comunicação –

Apesar de ouvirmos falar de algoritmos, a verdade é que não é um tópico muito explícito nas plataformas sociais – ainda que determine tudo o que vemos. Por que ouvimos tanto, mas sabemos tão pouco sobre como funcionam? Como é que moldam as nossas experiências e qual o seu impacto na vida dos influenciadores digitais e de quem tem negócios online?

A omnipresença do Algoritmo

Na era em que vivemos, os algoritmos estão omnipresentes em praticamente tudo, porque todos os dias usamos aparelhos que funcionam através deles: os smartphones, as smart TV’s, os computadores, os tablets, os smartwatches, entre outros gadgets. À medida que os usamos deixamos um rasto de dados – que serão criteriosamente organizados e desenvolvidos pelos ditos algoritmos.

Quando se parte da ótica do utilizador “comum”, que navega tranquilamente pela internet, para uma perspetiva mais ampla e mais profunda sobre a atuação dos algoritmos e a sua influência nas nossas vidas (que trespassa a esfera digital), começam a surgir diversas questões acerca do poder algorítmico – e quem tem negócios online, cuja prosperidade depende do Algoritmo, que o diga.

Parece evidente que os algoritmos vão plasmando a nossa realidade e até a nossa personalidade. E é nesse sentido que, nesta reflexão, se coloca a comparação do algoritmo com um deus.

Uma breve definição de Algoritmo

No meio tecnológico, e dito de uma forma simplista, o algoritmo é um modelo matemático que segue um padrão, baseado num conjunto de dados. Esse padrão vai-se repetindo, e caso surjam erros, são corrigidos e aprimorados através de Inteligência Artificial.

No princípio era o Verbo: a criação do algoritmo

Neste vídeo descomplicado, Cathy O’Neil, uma cientista irreverente na área de big data, descreve como funcionam os algoritmos. Além de reiterar que se baseia num conjunto de dados (a nossa atividade online) acrescenta que o segundo elemento principal é o objetivo desse algoritmo (definido por quem o construiu, que lhe incorpora os seus interesses e valores), o que muda tudo.

video truth algorithmsVídeo: The Truth About Algorithms por Cathy O’Neil

O Algoritmo de recomendação

Quando se fala de “Algoritmo”, por norma associamos ao algoritmo de recomendação, muito desenvolvido pelo Google e pelas redes sociais – e no qual apostam todas as suas cartas, cada vez mais.

Novamente, através da nossa atividade online (o que é que pesquisámos, como reagimos, com quem interagimos, de que é que gostámos, que comentários fizemos e onde, que páginas que abandonámos, o que ouvimos, o que comprámos, etc), o algoritmo faz um mapeamento para que nos seja apresentado conteúdo relevante, em detrimento de outro. De forma dinâmica (e certamente devido às preferências demonstradas pelos utilizadores), existem alguns critérios a ter em consideração nas redes sociais.

Os mandamentos do Algoritmo das redes sociais

O Algoritmo das redes sociais rege-se, essencialmente, por quatro princípios para apresentar os conteúdos potencialmente relevantes a um determinado utilizador:

  • em que formato está o conteúdo;
  • quanto tempo é que o utilizador permanece em dado conteúdo:
  • quão popular é o conteúdo;
  • que relação/interação existe entre o utilizador e esse conteúdo ou quem o publicou.

Há que ressalvar que esta é uma abordagem geral, porque, no fundo, cada rede social apresenta as suas especificidades algorítmicas. Por exemplo, há quem diga que o TikTok tem um Algoritmo mais avançado do que as concorrentes, e que permite aos utilizadores alcançar uma grande audiência mesmo sem terem um grande número de seguidores.

As várias faces do Algoritmo

Para o utilizador comum

Uma realidade recomendada por algoritmos

Tudo o que fazemos online, portanto, conta. Por um lado, isto leva a uma otimização da nossa experiência online, porque a informação é mais personalizada, o que nos poupa tempo e proporciona descobertas interessantes.

Além disso, facilita-nos a integração no diálogo social e político com o qual nos identificamos – quer através das comunidades que encontramos nas redes sociais como outras plataformas, e, por vezes, até fora do meio digital.

Por outro lado, numa perspetiva mais humana, menos digital, dá que pensar: como é que a nossa realidade se vai moldando com base nestas recomendações? Até que ponto estamos conscientes desse poder algorítmico no nosso dia-a-dia.

Para os influencers (e para as marcas)

O jogo da visibilidade

O desafio dos influenciadores digitais, especialmente quando trabalham em parceria com marcas, não é fácil: têm de criar conteúdo autêntico, satisfazer os interesses das marcas que os patrocinam, e, ao mesmo tempo, acompanhar o compasso ditado pela lógica numérica. O seu sucesso depende da sua visibilidade digital, que precisa de obedecer, pelo menos, àqueles quatro princípios/mandamentos mencionados anteriormente.

E é neste ponto que o Algoritmo surge como uma espécie de deus, que ora recompensa ora castiga. Neste caso, a recompensa está relacionada com a visibilidade que os influenciadores recebem caso cumpram os requisitos (que incluem, ainda, as Diretrizes da Comunidade).

Quando a sua performance na esfera digital fica sob a ameaça da invisibilidade do algoritmo, os influencers mais conscientes do poder do algoritmo e dispostos a enfrentá-lo, em parte por falta de alternativa, entram no “jogo da visibilidade”.

Num artigo dedicado a esse tema, a investigadora americana Kelley Cotter observa que, embora os influencers reconheçam que o número de seguidores e as taxas de interação ditam a visibilidade, as suas abordagens para convir ao algoritmo divergem. Ao passo que uns apostam numa interação mais pessoal com os seus seguidores e potenciais seguidores, realçando a sua autenticidade perante o Algoritmo, outros tentam provar-lhe a sua popularidade, enfatizando as suas conquistas pessoais.

Afinal, quem dita as regras do jogo nas redes sociais?

Existe, portanto, algum espaço de manobra para os utilizadores – neste caso, os influenciadores digitais – se destacarem nas redes sociais, movendo-se estrategicamente consoante as diretrizes algorítmicas.

Mas, se o sistema algorítmico se baseia nas expectativas do comportamento dos utilizadores e eles o manipulam, como pode o Algoritmo interpretar os resultados de forma efetiva? Estarão os influencers a infringir as regras do jogo?

No mesmo artigo, Cotter afirma perentoriamente que não. Pelo contrário, eles atuam segundo as regras, reconhecendo que é um meio para atingir um fim (ou seja, a sua visibilidade), ainda que se possa, nesse processo, perder algum espírito do jogo.

Com efeito, as “regras do jogo”, são, também elas, disponibilizadas (ou omitidas) pelas próprias plataformas de forma estratégica, nos “Termos de Utilização”. E, obviamente, serão sustentadas pela arquitetura algorítmica. Além disso, através do ciclo de feedback que as plataformas vão transmitindo ao algoritmo, também as diretrizes vão mudando.

E é através dessa dinâmica que o Algoritmo, qual deus que castiga se o comportamento do crente não segue as suas leis, retira visibilidade a quem não as siga. Logo, é inútil tentar demonizar os influencers.

O futuro dos algoritmos, dos influencers e da humanidade

O inconsciente tecnológico

Independentemente de se ser influencer ou um utilizador comum, está claro que apenas vemos o que os detentores das plataformas querem que vejamos, dada a limitação de informação que está ao nosso alcance. Consequentemente, isso condiciona a nossa realidade.

Esse é, justamente, um dos pontos mais interessantes do artigo de Cotter: a alusão ao “inconsciente tecnológico” produzido pelo algoritmo. Este exerce poder sobre o nosso dia-a-dia sem nos darmos conta, criando um fenómeno social que nos faz acreditar em algo, independentemente de ser verdadeiro.

No fundo, não é algo surpreendente, tendo em conta que os algoritmos são desenvolvidos de maneira a recriar a própria inteligência humana.

Fia-te no Algoritmo e não corras…

Voltando a Cathy O’Neil, a cientista de dados, ela afirma categoricamente que os algoritmos são opiniões assentes em matemática, e não factos – como tendemos a acreditar. Pautada pela sua assertividade, declara que são empresas privadas que criam algoritmos privados para fins, também eles, privados. Ou seja, os algoritmos conduzem a poder privado.

E, justamente por isso, e de forma mais elaborada, numa TED Talk sobre big data, O’Neil alerta para o perigo de confiarmos demasiado no algoritmo, que tende a ser usado durante um longo período de tempo e sem ser necessariamente fiável. Deixa de o ser porque, entretanto, a realidade vai mudando e a fórmula matemática torna-se obsoleta – e, amiúde, injusta.

Assim, quem usa o meio digital para fins comercias, sejam marcas ou influencers, precisa de dosear a sua atuação, não se devotando totalmente às regras algorítmicas, sob pena de sucumbir ao seu julgamento impiedoso.

Isto conduz-nos à questão ética. Se os algoritmos fazem parte do dia-a-dia das massas, mas são criados por um grupo pequeno, que pretende atingir um determinado objetivo/lucro, como se garante a preservação moral daquilo que nos é deliberadamente mostrado, cujo impacto é previsível, sobretudo nos mais novos? Se dos influencers é esperada autenticidade, também devemos reivindicar dos detentores das grandes tecnológicas que atuem segundo princípios éticos.

Onde é que tudo isto nos leva?

Até certo ponto, o Algoritmo é-nos bastante conveniente no dia-a-dia, quando nos filtra a informação e nos recomenda conteúdos interessantes que, quem sabe, nunca conheceríamos de outra forma.

Mas devemos reconhecer que, de cada vez que renunciamos à privacidade dos nossos dados em troca de acesso a conteúdos do momento ou subscrições em páginas da web, estamos, por assim dizer, a “vender a alma” ao Algoritmo.

Ainda que os algoritmos não atuem unilateralmente, graças à dinâmica que existe entre eles, os utilizadores e as plataformas que os interligam, é crucial tomarmos consciência que, à medida que acedemos passivamente às recomendações do Algoritmo, vamos-lhe transferindo, cada vez mais, o poder de decidir por nós. Não só o que vemos e ouvimos, mas também com quem nos relacionamos, o que compramos e, em última instância, como pensamos e nos comportamos. Porque nesse processo, vamo-nos desconectando de nós próprios, da nossa consciência.

Entre a inteligência e a consciência humana

Por mais que os algoritmos e a Inteligência Artificial estejam a evoluir a um ritmo sem precedentes, por trás das máquinas ainda estão pessoas – indivíduos com poder, é um facto, mas feitos de carne e osso como todos os outros.

Talvez a solução passe por decidirmos conscientemente a quem damos o nosso poder, e quanto: que informações escolho partilhar? Que imagens? Como alimento o meu perfil nas redes sociais? Que cookies escolho aceitar? Que websites decido visitar e usar como plataforma de compra online?

Tal como na vida fora do digital, temos de fazer escolhas todos os dias. E, no caso dos influencers, uma resposta pode passar por aceitar que, assim como a vida tem altos e baixos, porque tudo é impermanente e há condições externas que nos ultrapassam, também o Algoritmo pode mudar de forma imprevisível. Por isso, talvez não valha a pena tentar segui-lo cegamente, como se fosse uma divindade.

Finalmente, para quem se interessar pela temática dos algoritmos, fica uma sugestão de leitura – que, em parte, serviu de base para esta reflexão). Trata-se do livro “Homo Deus”, do aclamado Yuval Noah Harris. Nesta obra que explora a evolução da humanidade, Noah Harris aborda o “dataísmo”, uma espécie de nova religião que se baseia no fluxo dos dados (data) e no valor de cada um e de cada coisa de acordo com a sua participação no processamento de dados.